sábado, 26 de março de 2011

"Capitães da Areia"

Eu devia ter uns 13 ou 14 anos quando a peça "Capitães de Areia" virou febre entre as adolescentes da época. Devo ter implorado algumas centenas de vezes à minha mãe que me deixasse assistir à peça. Mas teatro nunca foi programa para pobres, logo tive que ser uma filha adolescente compreensiva e conformada (isso existe?!) e abandonar a ideia.
Pelo visto, foi minha mãe quem decidiu não fazer isso, pois um dia ela apareceu com o livro em casa. Disse que viu num sebo e trouxe para mim. Ganhei a chance de imaginar a minha própria versão teatral do livro de Jorge Amado!
Lembro-me de ter devorado o livro. De me emocionar e vibrar com as aventuras de Pedro Bala e os Capitães da Areia, meninos abandonados de Salvador. Além de chorar horrores quando a Dora, mãe e irmã dos meninos, morreu...
Hoje, 20 anos depois, terminei de reler o livro. Confesso que chorei um pouco mais que da primeira vez. E não foi pelos mesmos motivos...
Como a gente passa a vida de cara para a miséria e não percebe ela ali? Como a gente esquece que aquelas crianças de rua, que tanto nos apavoram e, muitas vezes, despertam nosso ódio, são só crianças? Crianças que não tiveram o direito de ser criança...
A gente se acomoda no conforto do sofá de casa e esquece, ou pior, ignora que há fome, miséria, abandono, injustiça do lado de fora.
Aí então vem Jorge Amado e sua prosa (que contém tanta poesia) - que se faz necessária - para nos tirar da inércia!
Um livro que nos proporciona experimentar diversas sensações e emoções. Que nos permite (re)pensar a nossa sociedade e as atitudes e escolhas que fazemos...
Eu recomendo!
                                           Foto de José Maria Melo

quarta-feira, 9 de março de 2011

Dentre os sentimentos despertados, eis mais um...


O Filho Que Eu Quero Ter
É comum a gente sonhar, eu sei
Quando vem o entardecer
Pois eu também dei de sonhar
Um sonho lindo de morrer

Vejo um berço e nele eu me debruçar
Com o pranto a me correr
E assim, chorando, acalentar
O filho que eu quero ter

Dorme, meu pequenininho
Dorme que a noite já vem
Teu pai está muito sozinho
De tanto amor que ele tem

De repente o vejo se transformar
Num menino igual a mim
Que vem correndo me beijar
Quando eu chegar lá de onde vim

Um menino sempre a me perguntar
Um porquê que não tem fim
Um filho a quem só queira bem
E a quem só diga que sim

Dorme, menino levado
Dorme que a vida já vem
Teu pai está muito cansado
De tanta dor que ele tem

Quando a vida enfim me quiser levar
Pelo tanto que me deu
Sentir-lhe a barba me roçar
No derradeiro beijo seu

E ao sentir também sua mão vedar
Meu olhar dos olhos seus
Ouvir-lhe a voz a me embalar
Num acalanto de adeus

Dorme, meu pai, sem cuidado
Dorme que ao entardecer
Teu filho sonha acordado
Com o filho que ele quer ter



Poesia hereditária

Tive alguns minutos com o João essa semana que passou, e, como sempre, são momentos fantásticos...
Dessa vez ele me acompanhou numa viagem a minha infância, e tivemos como nosso guia o saudoso Vinicius de Moraes. Eis a história...
João terá como sua primeira leitura em sua nova escola os poemas de "A Arca de Noé". Eu tinha o disco quando era criança. E minha mãe cantava as musiquinhas comigo. Uma lembrança tão doce... tão feliz...
Na tarde em questão o João veio aqui pegar o tal livro (que foi comprado pela internet: bom saber que apesar de tanta tecnologia e modernidades, ainda podemos contar com as poesia de Vinicius de Moraes!). Ele sempre fica ansioso com os livros. Logo os abre e folheia e quer ler comigo (aí me vem o desejo de que seja sempre assim...)! Foi o que fizemos. Abrimos o livro (uma verdadeira máquina do tempo!), folheamos e começamos a ler alguns poemas. Contei o mito da Arca de Noé pra ele. Cantei algumas das canções de que ainda lembrava. E ele se deliciava, com música e poesia! E desejei que aquele instante se cristalizasse...
Senti como se minha mãe estivesse ali, revivendo a cantoria da casa muito engraçada...
Logo o João foi embora, meu irmão sempre com pressa! E eu fiquei aqui com essa doce nostalgia...